quarta-feira, setembro 24, 2008

50 anos de vida – 20 anos de Constituição Federal

Quando nasci, em 1957, no Brasil 5 constituições tiveram sua vigência plena, a saber: 1824 (Imperial), 1891 (1ª republicana), 1934, 1937 (a Polaca), 1946, e posteriormente mais 3 continuaram a saga de fábrica de constituições da nação brasileira: 1967, 1969 (Ec 01/09) e 1988.

Fazendo uma retrospectiva vemos que o Brasil teve uma nova constituição a cada 23 anos aproximadamente, sendo a mais longeva delas a Imperial que durou 67 anos, e a mais curta a de 1967, com apenas 2 anos.

O que leva nosso país a ter sua lei magna mudada a cada 23 anos? Talvez a resposta possa ser encontrada na seguinte definição de constituição: Constituição é a soma dos fatores reais do poder que governa nossa sociedade (Lassalle Ferdinand, o que é uma constituição)

A partir dessa definição podemos começar a entender o significado de tantas constituições pois sendo o resultado das forças reais que regem a nação, podemos concluir que as constituições revogadas não foram feitas de acordo com as forças reais que governam nossa sociedade, sendo a exceção a constituição imperial que foi revogada com a implantação do regime republicano.

Prosseguindo nessa análise e falando da constituição que ora aniversaria notamos que suas regras são sistematicamente desrespeitadas por toda a sociedade brasileira, e principalmente por aqueles que deveriam respeitá-la e fazê-la ser cumprida, os três poderes da república.

O principal ataque vem da parte do legislativo com uma inoperância legislativa e uma avidez por emendar a constituição que ouso dizer que desfiguraram completamente a constituição cidadã de Ulysses Guimarães e a transformaram numa verdadeira colcha de retalhos, e que ficará cada vez mais retalhada se levadas em conta todas as emendas constitucionais em trâmite no congresso nacional.

Segundo Ives Gandra em artigo denominado “Os Males da Constituinte” (Revista Visão Jurídica, nº 21) “no momento, há 1600 projetos de emenda constitucional (1200 na Câmara e 400 no Senado)”, o que mostra claramente a falta de preparo do legislador que pensa ser a constituição um simples texto de lei ordinária, a qual pode ser alterada ao seu bel prazer.

Ainda segundo Gandra, no artigo acima citado, foram “aprovadas 59 emendas (53 no processo ordinário e 6 no processo revisional) em menos de 20 anos, quando a constituição americana recebeu 24 emendas em 220 anos”, o que evidencia de forma clara e inequívoca como a constituição federal já foi e pode ainda ser desfigurada.

Um dos grandes males de que padece nossa constituição é ter nascido parlamentarista, mas viver e reger um sistema presidencialista, sem que uma reforma séria a adequasse ao novo sistema de governo, escolhido em plebiscito pela população brasileira, restando assim diversos mecanismos que emperram o sistema, como as medidas provisórias que entulham a votação de projetos e atrapalham a atividade legislativa.

O poder executivo também tem sua cota de desrespeito a legislação constitucional pois muitos dos direitos nela garantidos são sistematicamente desrespeitados, a começar pelo direito à privacidade como mostram claramente as escutas telefônicas que recentemente abalaram o pais, no escândalo conhecido como grampolândia, em que até o presidente do Supremo Tribunal Federal descobriu que havia sido vitima de escutas telefônicas perpetradas por possíveis servidores públicos federais, e como sempre a discussão debandou para a capacidade técnica do órgão

acusado em fazer ou não a escuta, mas mais uma vez negligencia o mais importante: a transparência com que as investigações devem ser feitas, principio constitucional da administração pública.

Também tal desrespeito atinge ao judiciário, pois tendo em vista o número de normas legais em algum momento uma decisão estará desrespeitando a Constituição Federal.

Os dados abaixo foram tirados de um estudo denominado “Quantidade de Normas Editadas no Brasil: 18 anos da Constituição Federal de 1988”, publicado pelo IBPT Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (disponível em http://www.ibpt.com.br/estudos/estudos.viw.php?estudo_id=9a1158154dfa42caddbd0694a4e9bdc8), e espelham muito bem o
verdadeiro “Samba do Crioulo Doido” que se transformou o sistema Judiciário Brasileiro que não consegue entender, conhecer e aplicar as leis que compõem nosso sistema legal, e desrespeita o Código de Processo Civil, e por tabela a Constituição Federal.

“Desde 05 de outubro de 1988 (data da promulgação da atual Constituição Federal), até 05 de outubro de 2006 (seu 18° aniversário), foram editadas no Brasil 3.510.804 (três milhões, quinhentos e dez mil, oitocentos e quatro) normas que regem a vida dos cidadãos brasileiros. Isto representa, em média 534 normas editadas todos os dias ou 738 normas editadas por dia útil”.

“Normas Gerais Federais”

“No âmbito federal, foram editadas 141.771 normas desde a promulgação da Constituição Federal, passando por 6 emendas constitucionais, 2 leis delegadas, 63 leis complementares, 3.701 leis ordinárias, 940 medidas provisórias originárias, 5.491 reedições de medidas provisórias, 8.947 decretos federais e 122.568 normas complementares (portarias, instruções normativas, ordens de serviço, atos declaratórios, pareceres normativos, etc.)”.

“Em média, foram editadas 21,57 normas federais por dia ou 31,6 normas federais por dia útil nestes 18 anos”.

Para uma comparação o artigo fala em seis emendas constitucionais, hoje são mais de 50, e se todas as emendas citadas por Gandra se concretizarem provavelmente a constituição brasileira passará ao livro dos recordes de constituição mais emendada do mundo.

A pergunta que devemos fazer neste momento é: temos alguma coisa para comemorar após a promulgação da Constituição Federal de 1988?

Sim, e a resposta só pode ser afirmativa, pois embora haja ainda muito por fazer, vivemos uma liberdade sem precedentes em nossa história, ou para citarmos a frase favorita no Excelentíssimo Senhor Presidente da República: “Nunca antes na historia deste país...” tivemos tanta cpi investigando desmandos do poder, prisão de gente considerada graúda, queda de ministros por suspeita de negócios ilícitos, e mesmo que não se chegue á uma conclusão onde se devam punir os culpados e pouquíssimos são efetivamente punidos, mas pelo menos começa a se mostrar a face oculta do poder, e isso nos três poderes da república.

Falta muito ainda para termos uma verdadeira democracia, mas estamos no caminho, porém é necessário um amplo respeito à carta magna do país, por parte do governo, e principalmente por parte do povo brasileiro, pois na medida em que conhecer a constituição federal saberá dos seus direitos (o que todos tem na ponta da língua), mas conhecerá a suas obrigações para com a nação, e poderá cobrar dos três poderes da República o efetivo respeito e obediência às normas constitucionais.