domingo, janeiro 16, 2011


Nosso Direito 
Linguagem Jurídica e Juridiquês

Ubi societas, ubi jus.

"Com espia no referido precedente, plenamente afincado, de modo consuetudinário, por entendimento turmário iterativo e remansoso, e com amplo supedâneo na Carta Política, que não preceitua garantia ao contencioso nem absoluta nem ilimitada, padecendo ao revés dos temperamentos constritores limados pela dicção do legislador infraconstitucional, resulta de meridiana clareza, tornando despicienda maior peroração, que o apelo a este Pretório se compadece do imperioso prequestionamento da matéria alojada na insurgência, tal entendido como expressamente abordada no Acórdão guerreado, sem o que estéril se mostrará a irresignação, inviabilizada ab ovo por carecer de pressuposto essencial ao desabrochar da operação cognitiva."

Caro leitor, você entendeu o que está transcrito acima? Provavelmente não, e muitos operadores do direito (advogados, juízes, promotores, serventuários, delegados) também não conseguirão apreender o significado do trecho acima.

Por tradição e por necessidade a linguagem do Direito é uma linguagem formal, dentro das regras da escrita correta, não podendo derivar para uma linguagem mais coloquial, e atualmente, com uma grande divulgação de noticias sobre o Poder Judiciário pela imprensa, vem sendo questionado o uso de expressões latinas e vernáculo (usado aqui com o sentido figurado significando o uso genuíno; correto; puro da linguagem, linguagem culta).

Escrever de forma correta não significa usar palavras que não estão em uso corrente ou em latim, mas sim respeitar as regras gramaticais e ortográficas, e o raciocínio lógico para desenvolver o tema abordado de forma inteligível para as pessoas compreenderem.

Isso tem grande importância no Direito, pois uma interpretação errônea (poderia ter usado: errada) da petição, do despacho, da sentença, do parecer pode causar efeitos danosos às partes no processo ou até mesmo à sociedade, como foi o caso da libertação do acusado da morte de um grande empresário dono de famosa cervejaria, em que a interpretação do confuso texto do desembargador levou o juiz a interpretar que o acusado deveria ser colocado em liberdade, e determinou tal providência, sendo que uma lida no texto da decisão deixa claro (???) que o pedido de liberdade foi negado: “Diante do exposto, conhecida em parte, na parte conhecida concede-se parcialmente a ordem impetrada, tão somente, para anular o depoimento das testemunhas protegidas pelo Provimento CG n° 32/2000, com reínquirição das mesmas, após as providencias acima recomendadas, ficando denegada a pretensão formulada na sustentação oral, de concessão de ordem de Habeas Corpus de ofício deferindo liberdade provisória ao paciente. HABEAS CORPUS n° 454.823-3/3 do TJSP”.

O fato é que embora muitas vezes o operador do direito, e principalmente o Advogado, necessite usar termos técnicos para expor sua idéia, esse uso deve se restringir ao mínimo, mas sempre respeitando as regras gramaticais e ortográficas, pois o próprio código de processo civil em seu artigo 156: “em todos os atos e termos do processo é obrigatório o uso do vernáculo”, que voltamos a dizer tem seu sentido aqui de linguagem culta e correta.

Para finalizar explico o sentido das duas frases destacadas no inicio deste artigo; a primeira, onde existe sociedade, existe o direito, e a segunda diz que: um recurso para ser examinado nos tribunais superiores deve enfocar a matéria apreciada pelo juiz de instância (define a hierarquia do poder judiciário) ao julgar a causa. Se isso não acontecer o recurso será simplesmente rejeitado, ou não aceito, sem que se julgue o mérito (questão principal) do processo.

Diante de tais considerações, e não tendo a pretensão de esgotar o assunto, deixo a vocês, caros leitores, para sua reflexão sobre a dificuldade em se fazer uma peça processual de qualidade, os seguintes pensamentos de Ludwigg Wittgenstein, filósofo austríaco, cuja obra Tractatus Logico-Philosoficus faz uma série de proposições, inclusive sobre a linguagem:

Proposição 5.6 : “Os limites de minha linguagem significam os limites de meu mundo"

“A linguagem é um labirinto de caminhos. Você entra por um lado e sabe onde está; você chega por outro lado ao mesmo lugar e não sabe mais onde está”.

Semana que vem voltaremos a abordar o assunto. Até lá...

Nota: o texto hemético que abre este artigo foi me enviado via internet por um amigo, que não citou a fonte, por isso faço a ressalva. 

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